Soluções Baseadas na Natureza: o desafio da biodiversidade invisível e dos darkspots

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Quando falamos em biodiversidade, pensamos logo nas espécies conhecidas: florestas tropicais exuberantes, animais icônicos, flores raras. Mas e tudo aquilo que ainda não foi descoberto? Que permanece invisível nos mapas, nas coleções científicas, nas decisões de conservação?

No Dia Internacional da Biodiversidade, celebrado em 22 de maio, vale perguntar: como proteger o que nem sabemos que existe? Essa é a pergunta por trás de um conceito cada vez mais discutido entre cientistas: os darkspots, regiões onde há vida, mas o conhecimento ainda não chegou. Leia até o final para entender mais!

Imagem: Distribuição global dos déficits de conhecimento Linnaean (espécies ainda não descritas) e Wallacean (espécies sem localização geográfica). Tons escuros indicam maiores déficits. Destaque para os 5 países com maiores lacunas por continente. Fonte: “Plant diversity darkspots for global collection priorities”, Ian Ondo et al. 2024

A biodiversidade invisível: um desafio para a conservação

Um conceito inovador publicado recentemente na revista científica New Phytologist ajuda a responder essas perguntas. O artigo apresenta a ideia dos “darkspots” – pontos escuros no nosso conhecimento da biodiversidade. São regiões e espécies sobre as quais sabemos muito pouco, mesmo quando há evidências de que abrigam uma diversidade biológica significativa. Em outras palavras, são lugares onde a biodiversidade existe, mas ainda não foi formalmente registrada ou estudada.

Esses darkspots não são vazios ecológicos. Ao contrário, são potenciais centros de diversidade e de soluções para os desafios ambientais que enfrentamos. O problema é que, por não aparecerem nos dados científicos ou nas políticas públicas, eles também não entram no radar da conservação.

Onde o conhecimento ainda não chegou

A biodiversidade que não vemos é a que mais precisa de proteção.

O Brasil é o país mais biodiverso do mundo, e ainda assim abriga grandes lacunas de conhecimento. Sabemos muito mais sobre a Mata Atlântica costeira do que sobre o Cerrado profundo; mais sobre a Amazônia do que sobre os campos do Sul. Espécies nativas da Caatinga, dos Pampas e de outros biomas pouco estudados estão sub-representadas nos bancos de dados, nos herbários e nas coleções científicas.

Micranthocereus. Foto: Guillermo Rivera

O que falta nos bancos de dados muitas vezes está vivo nos saberes locais. Povos indígenas, comunidades quilombolas e ribeirinhas detêm saberes profundos sobre espécies e ecossistemas pouco estudados pela ciência formal. No entanto, esses saberes ainda são pouco valorizados  nas decisões que moldam o futuro da biodiversidade.

Soluções baseadas na natureza exigem conhecimento real da biodiversidade

O que são Soluções Baseadas na Natureza?

As chamadas Soluções Baseadas na Natureza (SbN) têm ganhado destaque no enfrentamento às mudanças climáticas, à degradação ambiental e à perda de biodiversidade. Elas consistem em ações que protegem, restauram e manejam de forma sustentável os ecossistemas naturais e modificados, promovendo benefícios tanto para a natureza quanto para as pessoas.

Alguns exemplos de SbN incluem a restauração de manguezais para proteção costeira, a implementação de corredores ecológicos para a fauna silvestre, o uso de infraestrutura verde nas cidades para amenizar as ilhas de calor (fenômeno climático urbano onde a temperatura do ar é significativamente mais alta nas áreas urbanas em comparação com as áreas naturais circundantes), e a agricultura regenerativa que promove a conservação do solo e da biodiversidade local.

Manguezal, Delta do Parnaíba. Foto: Tarciso Leão

Mas há um alerta importante: para que as SbN sejam eficazes e justas, é preciso conhecer a biodiversidade real de cada território. E isso inclui não apenas as espécies mais conhecidas ou estudadas, mas também aquelas que compõem os chamados darkspots

Ignorar essas lacunas pode levar à implementação de soluções incompletas, que não respeitam a diversidade ecológica e cultural local. 

Além disso, ao deixar essas regiões de fora podemos estar perdendo oportunidades valiosas de aprender com novos  serviços ecossistêmicos e estratégias naturais ainda não reconhecidas.

Iluminar os darkspots é tarefa coletiva

Felizmente, há caminhos possíveis. A valorização da botânica, o fortalecimento de herbários regionais, o apoio à ciência cidadã e a inclusão de saberes tradicionais são passos concretos para revelar a biodiversidade invisível. 

Outro eixo essencial é o fortalecimento da cadeia de produção de mudas e sementes nativas. Investir em viveiros locais, capacitar coletores, criar redes de troca e valorização dos materiais genéticos de cada bioma são estratégias fundamentais para ampliar o conhecimento sobre a flora e garantir a disponibilidade de espécies adaptadas às realidades ecológicas e culturais de cada região.

O compromisso da Nativas Brasil com uma biodiversidade mais visível, protegida e plural

Na Nativas Brasil, acreditamos que proteger a biodiversidade começa por conhecê-la e valorizá-la em toda a sua complexidade — inclusive aquela que ainda não foi plenamente descrita. Nosso trabalho se baseia em três pilares: o fortalecimento dos viveiros e da produção de plantas nativas; o incentivo a práticas de restauração ecológica e uso das espécies nativas dos biomas brasileiros, e a comunicação como ferramenta de posicionamento para a incidência em políticas públicas que fortaleçam o setor de produção de nativas.

Um exemplo concreto desse compromisso é o apoio ao Viveiro Muda Tudo, da nossa Vice Presidente Bárbara Pellegrini. O viveiro não só produz mudas nativas da Mata Atlântica, como também mapeou e georreferenciou cerca de 500 espécies vegetais, contribuindo para ampliar o conhecimento sobre a flora da região e fortalecer a conservação com base na ciência e no cuidado.

Viveiro Muda Tudo. Foto: Bárbara Pellegrini

Nosso compromisso é com uma conservação que une ciência, saberes locais e ação concreta. Atuamos para iluminar os darkspots da flora brasileira: destacando espécies negligenciadas, promovendo a diversidade por bioma e fortalecendo as redes que conectam pessoas, plantas e territórios.

Neste Dia Internacional da Biodiversidade, convidamos você a refletir: que espécies fazem parte da sua paisagem? Quais plantas você conhece e quais ainda estão invisíveis para você?

Plantar espécies nativas é um gesto de reconexão, e juntos, podemos construir um futuro onde nenhuma espécie – e nenhum saber – fique no escuro.

Escrito por: Camila Rodrigues – Greenbond Conservation 

Revisado por: Juliana Badari – Greenbond Conservation

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